Cotidianamente, ouvimos o termo boa-fé, cujo significado essencial é honesto, sincero, justo, leal, nas mais diversas aplicações possíveis. Na aplicação jurídica foram convencionados dois tipos de boa-fé, a subjetiva e a objetiva. Mas qual a diferença entre elas?
A boa-fé subjetiva é intrínseca ao sujeito, trata-se da consciência, é a própria intenção do agente, contrapondo-se a má-fé, que no direito civil deve ser provada. Já a boa-fé objetiva trata da conduta do agente, seu comportamento em respeito a lealdade contratual e jurídica. Não se trata apenas do respeito às formas ou a legalidade, mas, principalmente, à ética.
A boa-fé objetiva é um princípio jurídico que surgiu na Alemanha, no século XVIII. No Brasil, só foi positivado em 1990, com o Código de Defesa do Consumidor. Posteriormente, em 2002, passou a orientar as normas de Direito Civil. No Código de Direito Civil anterior, de 1916, era considerada apenas a boa-fé subjetiva.
O grande avanço, dessa mudança, é que as relações privadas deixaram de ser regidas pelas intenções contrapostas a má-fé, como ocorria na vigência do Código Civil de 1916, e passaram a serem regidas pelo comportamento ético, que corrobora os negócios realizados, inclusive pela verificação, no caso concreto, da equidade de direitos e obrigações nos pactos realizados.
Quando se fala em boa-fé objetiva, remete-se a comportamento, fidelidade, lealdade, tendo como ideia principal o agir sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ao próximo, fazendo com que as relações sejam tratadas de maneira objetiva e correta, considerado a conduta proba frente à vedação contra abusos, desequilíbrios e prejuízos a terceiros.
O princípio da boa-fé objetiva exige que as partes se comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a formação e o cumprimento do contrato. Este princípio é uma cláusula geral para a aplicação no direito obrigacional, que permite a solução do caso levando em conta fatores meta-jurídicos e princípios jurídicos gerais, em detrimento ao contrato, cujas clausulas objetivem prejudicar alguma das partes, mesmo que este esteja em consonância com a lei.
Tal princípio, enseja, também, a caracterização do inadimplemento mesmo quando não haja mora ou inadimplemento absoluto do contrato. É o que a literatura jurídica moderna denomina violação positiva da obrigação ou do contrato. Desse modo, quando o contratante deixa de cumprir alguns deveres anexos, por exemplo, esse comportamento ofende a boa-fé objetiva e, por isso, caracteriza inadimplemento do contrato.
Entretanto, é importante lembrar que o princípio da boa-fé objetiva não elimina o princípio clássico da autonomia de vontade. Ao contrário, ele aumenta sua função restritiva, em garantia à preservação dos direitos das partes. Nesse sentido, a boa-fé objetiva pretende corroborar a função social dos contratos, uma vez que, restringe a autonomia privada em proteção aos contraentes.
Assim, não se deve pautar as relações contratuais puramente pela lei, ou por formalidades burocratizantes. Deve-se primar pela conduta leal e honesta, pois esta sim, será objeto de análise em um futuro litígio entre as partes.
Kelly Aparecida Vale é graduanda em Direito na Faculdade Kennedy
E-mail: kelly.vale@soukennedy.com.br; Instagram: @kelly_vale_ , @compartilharmonitoriajuridica; Site: http://www.compartilharmonitoria.com/
Mariane Eugênia Gonçalves é advogada
E-mail: marianegoncalvesadv@gmail.com; Instagram: @marianeeg1
Olá colegas civilistas é interessante ressaltar que a autonomia das partes dentro do direito civil como dito anteriormente não anula os aspectos da boa-fé, quero dar ênfase na boa-fé subjetiva, pois, essa trata-se da intenção intrínseca do sujeito para celebrar tal ato jurídico, se no caso o agente não estiver motivado corretamente e o ato nascer com dolo ou vício, como na teoria da árvore envenenada, de nada se aproveita a boa-fé objetiva, ou seja, mesmo que haja o cumprimento legal pelas partes o ato jurídico em sua matéria contém imperfeições, e portanto é passível de questionamentos, tanto a boa-fé… Leia mais »
Olá Isaque, excelente comentário, obrigada. Primamos pela ênfase na boa-fé objetiva pela forma direta com a qual se apresenta, uma vez que as condutas das partes em qualquer momento da relação obrigacional, pode demonstrar violação ou vício. Diferente da boa-fé subjetiva, cuja caracterização exige da parte lesada a prova da má-fé, que muitas vezes pode dificultar a implementação de direitos. Claro que entendemos e somos adeptos de que a boa-fé subjetiva deveria permear todas as condutas obrigacionais, contudo, frente a dificuldade da prova de má-fé, a aplicação da boa-fé objetiva e seu reconhecimento no ordenamento jurídico pátrio, representa grande avanço,… Leia mais »
A eticidade é de vital relevância para homeostase dentro do ordenamento civil. Para um equilíbrio na relação entre os particulares é necessário que as normas carregam consigo os valores intrínsecos presentes na gravitação social. Torna-se, assim, a boa-fé, o coração que bombeia os valores que devem ser protegidos dentro do negócio jurídico. Na relação jurídica equilibrada, o que é convencionado, deve ser tutelado e observado o seu adimplemento sob a preservação da boa-fé. Contudo a observância desse princípio é a ratificação do direito civil que em sua essência equilibra, “pedindo licença”, as relações entre os particulares.
Boa tarde prezados colegas! Esse é um tema muito interessante, pois trazer a ideia de boa-fé de maneira mais concreta para os contratos significa alcançar maior êxito para as relações jurídicas. Isso porque, com esse princípio regendo as relações, existe mais garantia de segurança para as partes envolvidas no contrato. Estabelecendo um padrão ético para a conduta delas, ou seja, impondo a atuação com honestidade e lealdade, ainda que tenham autonomia para decidirem o que é melhor para cada uma, a possibilidade de uma parte prejudicar a outra é muito menor, fazendo com o que os contratos cumpram com mais… Leia mais »
Os negócios jurídicos levam os contratantes a criarem direitos e contraírem obrigações devido à autonomia da vontade e à liberdade das partes, sendo esse princípio a base essencial dos negócios jurídicos conforme dispõe os arts. 113 e 422 do CC. Além disso, torna-se imperiosa a observância do princípio da boa-fé objetiva que atua como fundamento normativo (mesmo sendo invisíveis, mas existentes no nosso ordenamento jurídico) do contrato e diversos outros pontos, de maneira a tornar mais equânime as relações contratuais. Porquanto, a boa-fé objetiva espera que o indivíduo atue de acordo com determinados padrões sociais de lealdade, confiança recíproca, assistência,… Leia mais »
Olá, pois esse é um tema de suma importância para o direito civil, traz a ideia de boa-fé objetiva e subjetiva explicando suas formas e conteúdos sua relevância interpretação. A boa-fé trás maior êxito a relações jurídicas, para se ter um equilíbrio aos contratos, sendo assim os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé mesmo havendo imperfeições.
Oi Kethlen, obrigada por comentar. Entendo que, além do foco na interpretação a boa-fé objetiva, esta deve ser um requisito de validade do consentimento nos negócios jurídicos. Mesmo que os demais requisitos de validade estejam presentes, a boa-fé, bem como a função social devem ser privilegiados.